quinta-feira, 22 de maio de 2014

A insonia e eu (Chuck Palahniuk)

Trago-lhes um artigo muito bacana, escrito por um dos meus escritores contemporâneos preferidos, o fodástico Chuck Palahniuk, para o jornal britânico The Guardian (clique no link para acessar a matéria original).

A insonia e eu 

¨Ambien me ajuda a dormir mais noites do que eu me importo em admitir, embora eu esteja incerto sobre a qualidade desse sono.¨

  A insonia tem seu lado bom. Os escritores Joy Williams e Lewis Hyde descrevem como um artista deve estar ¨quebrado¨ para realizar um ato original de criação. Um escritor ou pintor deve estar abalado por um choque ou sofrimento que atordoa sua mente racional e permiti acesso para inspiração, essa ideia ousada vem de algum detalhe profundamente enterrado da psique ou de alguma inspiração externa. Abstinência funciona. Rejeição, também. Insonia funciona maravilhosamente. 
  Em 1993, eu me encontrava abandonado em Reno, Nevada, sem dinheiro e sem lugar para ficar. À noite eu perambulava sem sono através dos cassinos e restaurantes vazios, exausto, delirante, e inventando uma estoria sobre um cara que pensava que tinha insonia mas estava na verdade vivendo uma vida dupla: sempre que ele achava que estava dormindo seu alter ego se arriscava para ter todas as aventuras que ele mesmo nunca poderia ousar fazer conscientemente. À medida que o sol se levantou sobre a "maior pequena cidade do mundo", eu tinha a base de um romance escrito na minha cabeça.
  Outra escritora, uma grande amiga e bestseller Chelsea Cain, disse que escritores iniciam a vida contando estorias reconfortantes a fim de adormecerem como crianças. Ao longo do tempo, essas estorias crescem mais e mais detalhadamente até que elas assemelham-se aos épicos de Tolkien, mas elas mantem o método principal de relaxar na inconsciência. Elas se tornam um acumulativo, uma especie de canção de ninar cantada para si mesmos. Transformar esse habito em um estilo de vida é inevitável, como qualquer bêbado que sonha em possuir um bar. Os próprios romances da Chelsea, sua serie Heartsick e a sensacional nova serie Kick que ela lançará nesse verão, ela diz que são todas baseadas na saga de uma década que ainda à embala para dormir todas as noites. 
  È fácil amar a verdade, e a teoria da Chelsea soa verdadeira porque ela identificou um habito que eu também praticava desde minha infância sem dormir. Isso não deveria surpreender ninguém, mas partes das minhas estorias ¨reconfortantes¨ ao longo da vida, envolvem  lutar. Lutar e perder. Vença a luta na sua imaginação e você nunca mais vai dormir. Mas estudos mostram que depois de um boxeador ou lutador perder uma luta, seus níveis de testosterona caem drasticamente e seu metabolismo  diminui. Todas essas mudanças, especula-se , funciona para impedi-lo de entrar em uma nova luta, antes dele estar fisicamente recuperado. 
  È por isso que a maior parte do romance clube da luta era sobre perder lutas. Como eles dizem no livro e no filme ¨saia, arranje uma briga, e perca¨. Minhas longas lutas imaginarias seriam sem palavras e brutais, e então eu iria perder e cair no sono.
  Mais recentemente, eu encontrei um método menos dramático. Se eu me imagino, me movendo através de um espaço, por exemplo andando ao longo de um caminho através de uma floresta ou explorando uma grande casa vazia, eu durmo. Casas que relembram minha infancia funcionam  melhor que contar carneirinhos.
  Tal como as lutas, a linguagem estraga tudo. Qualquer coisa verbal estraga tudo. Falar ou mesmo pensar em palavras, encoraja algum aspecto do meu cérebro e me excita. Em vez de dormir, eu me encontro na mesa da cozinha, fazendo anotações para um novo projeto.
  Outro método que funciona é sentir frio, ou imaginar sentir frio. Eu imagino que estou enterrado na neve. É daí que surgiu a caverna de gelo no clube da luta. Outros insones que eu conheço abrem as janelas em meados do inverno, ou bebem água gelada antes de ir dormir. Na cama, como o corpo se aquece, eu cochilo.   
  Para ser honesto, Ambien me ajuda a dormir mais noites do que eu me importo em admitir, embora eu esteja incerto sobre a qualidade desse sono. Muito frequentemente eu me levanto de manhã pra descobrir que um sonambulo, uma versão maniaca de mim mesmo tem lavado e dobrado as roupas, reorganizado as prateleiras na garagem, limpado a lareira e embrulhado os presentes para o natal - talvez algum hibrido de Tyler Durden e Martha stewart. Essas manhãs são semelhantes as estorias de The Elves And The Shoemaker (Os elfos e o sapateiro): é uma maravilha encontrar esse trabalho chato feito, mas é inquietante não ter memoria de ter feito isso. 
  Ano passado, esses elfos prepararam o meu imposto de renda, não é difícil imaginar que em breve eles estarão escrevendo meus livros. Eu vou estar inteiramente afastado do processo. Mais e mais, como Brad Pitt disse, ¨você esta se permitindo tornar-se... Tyler Durden.¨ Poderia ser isso o que acontece quando uma pessoa toma tantas pirulas pra dormir? Você sair por aí e viver uma nova vida? Como alguém mais corajoso, mais ousado e melhor organizado? Eu espero que sim.

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